Setembrite é a inflamação mental que um aluno tem quando percebe que está entrando na reta final dos estudos preparatórios para os exames escolares de final de ano, principalmente os vestibulares.
Esta inflamação pode evoluir para uma doença que é a realização mental de que vai ser impossível conseguir se preparar adequadamente porque não há mais o tempo suficiente para estudar tudo o que precisa. Mas pode também evoluir para se reorganizar nos estudos, adotando o esquema de entrar no clima de reta final.
Em geral, estes vestibulandos são os que sempre deixaram para estudar tudo na véspera da prova, conforme seu hábito de procrastinar, que aparece também em suas outras atividades. A mente do procrastinador funciona diferente da média das pessoas e o oposto das pessoas previdentes, que não deixam nada para a última hora. Vestibulandos há de todos os tipos, mas são os procrastinadores os que mais tumultuam a vida dos outros.
Um filho mantém a sua procrastinação e folga porque sempre os seus pais e outros à sua volta conseguiram ajudá-lo de última hora. Com esta ajuda, ele aprende que não vale a pena esforçar-se e ser previdente, pois mesmo sem nada fazer consegue os mesmos resultados. Para os folgados o nada fazer já é um lucro, enquanto para o previdente o lucro está no deixar pronto para não ter que correr de última hora. Assim, o folgado não muda o seu comportamento enquanto estiver recebendo lucros: pelo contrário, acostuma-se a receber pronto, sem se incomodar com o esforço despendido pelos sufocados, e começa a sentir que tem direito de ser folgado. “Se nunca fiz, por que teria que fazer agora?”, pergunta-se ele.
Um ditado caipira diz que os donos podem arrastar o burro até a água, mas quem bebe é ele. Ninguém pode beber água por ele. Assim também o filho se depara com a verdade que nunca precisou ver: quem tem que estudar é ele e que ninguém pode estudar por ele!
Setembrite é quando o filho descobre que o maior responsável pela vida dele é ele mesmo e não os seus pais nem os professores. Nas provas aprovativas, ele sempre conseguiu ser ajudado, isto é, os pais, os professores, a sociedade beberam água por ele. Enquanto pudermos acreditar que o vestibular é uma prova competitiva séria, quem tem de beber água é o vestibulando. É ele que vai ter que estudar, mesmo que os pais sejam os que pagam a conta do prejuízo que ele provoca ao não entrar em uma faculdade decente.
O que os pais podem fazer por ele é limpar o caminho até a água, isto é, facilitar a sua vida, poupando-lhe os esforços diários para se dedicar mais tempo a recuperar o atraso, como, por exemplo, levá-lo para onde ele precisar ir; deixar o local de estudos o mais em ordem possível, sem elementos que lhe roubem a atenção; preparando refeições balanceadas; aconselhando o jovem a ter um sono recuperador etc. Talvez tenham que limitar focos de distrações que lhe tiram um precioso tempo, tais como internet, sites de relacionamentos, baladas, uso de bebida, maconha (ou qualquer outra droga, mesmo medicações que o estimulem a estudar porque estas desgastam a mente e com o tempo tornam-se prejudiciais por tirarem o poder de concentração e apresentar distúrbios comportamentais).
O vestibular é uma das poucas oportunidades que todos os brasileiros têm para se por à prova em igualdade de condições, onde o que vale é a meritocracia. Uma meritocracia que é medida pelo número de pontos conseguidos, e não por vantagens advindas de malandragens, estudos de última hora, simpatias, promessas não cumpridas. Portanto é também uma oportunidade aos pais verificarem se realmente o filho tem o valor que eles sempre lhe dedicaram.
Por: Içami Tiba (Psiquiatra e educador. Escreveu "Família de Alta Performance", "Quem Ama, Educa!" e mais 26 livros.)
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